Colar eletrônico

É caro Bentinho, eu acho que você não precisava de um colar desses, mas você é um cara tão teimoso...

Nosso problema com Bento são algumas manias caninas difíceis de aguentar. Ele gosta de provocar a cachorrada da vizinhança, como gosta! O vizinho do lado já fechou com telhas de alumínio nossa cerca, mas basta ele sentir o cheiro dos animais ali perto - e não precisa nem vê-los que isso não é mais possível -, para começar uma corrida barulhenta e enlameada junto à cerca, com nós todos de bobos atrás dele!

No fundo é mais ou menos a mesma coisa, ele vê os cachorrinhos do lado de lá, e fica a mesma confusão, a diferença que são todos do mesmo tamanho, enquanto os aqui do lado são enormes e se jogam sobre as telhas de alumínio fazendo um barulho assustador.

A bagunça acontece principalmente aos domingos, dia de cachorrada solta, ou à noite, quando os aqui do lado ganham liberdade e tomam conta do quintal do vizinho.

Ele tem também outra mania irritante, correr e latir para os carros que passam aqui na frente. E também outro hábito nada seguro, a gente abre o portão por um instante ele dá um jeito de fugir. Sei que é coisa de cachorro, mas não dá para ser mais civilizado? Afinal Bento é tão esperto que já é quase humano...

Ele já entendeu que não deve fazer estas coisas, tem vezes que basta eu mostrar a guia para ele pendurada em minha mão, que ele dá só mais uma corridinha (ele não resiste!) antes de correr para dentro de casa.

É que com o treinamento ele está aprendendo a obedecer a guia (não exatamente quem está no comando dela!)

Mas outra noite não funcionou mostrar e chacoalhar a guia, ele continuou na sua corrida insana com a galera do lado. Por fim perdi a paciência, e dei-lhe com a guia nos flancos. Ele deu mais uma corridinha e foi pra casa. Eu limpei-lhe a lama das patas enquanto dava uma bronca, e ele humilde se encolheu todo e ficou andando ao lado do meu pé, feito quase um tatu-bola.

Não que tenha lhe doído, mas ele ficou realmente sentido. Eu sou sua mãe adotiva, e desta vez peguei pesado demais... Fiquei com dó do bichinho, como é sensível a criatura!

Depois desse dia, ele corria com a cachorrada, eu mostrava a guia e dava um "Eeeiiii!", e ele só faltava vir rolando feito uma bola de tão curvo. Então eu lhe digo: "Muito bem!" enquanto lhe faço um carinho.

Ele já entendeu tudinho, mas continua teimando! É da sua natureza rebelde e alfa, então ganhou um colar eletrônico, que dá choques à distância com um controle remoto. Cruel? Eu também não gosto da ideia, mas não é para machucar, só para educar. O treinador já utilizou com ele algumas vezes, e ele entendeu de verdade que não deve fugir ou provocar os cães vizinhos, mas isso foi só naquele momento, para depois fazer tudo errado novamente.

Domingo ele vai usá-lo, estaremos de olho nele (e controle na mão) o dia todo. Espero que não sejam necessárias mais do que duas experiências negativas para ele desistir de seu mal comportamento. Eu sei que vocês torcem conosco, nós amamos nosso bichinho levado. Espero que com pouquíssimo uso possamos passar adiante o tal colar.